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Medo de assédio acompanha ciclistas nos pedais

Publicada dia 19/10/2021 às 09:55:51

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Um vídeo que viralizou nas redes sociais e virou notícia nacionalmente preocupou ciclistas de Santa Cruz e do País. Uma imagem de câmera de monitoramento na cidade de Palmas, no Paraná, registra o momento exato em que uma ciclista está pedalando em uma via movimentada, a luz do dia, quando um carro se aproxima e o passageiro do veículo passa a mão no seu corpo de forma sexual, ainda causando sua queda.

Segundo informações da polícia passadas à imprensa, quatro pessoas estavam no carro no momento do crime. Todos foram identificados, e o suspeito de tocar na vítima foi preso em flagrante por importunação sexual e lesão corporal. Em Santa Cruz, como em diversas cidades do Brasil, o número de ciclistas aumentou muito nos últimos meses, principalmente na pandemia. A repercussão deste vídeo entre os grupos de ciclistas da cidade foi grande. Elas se dizem revoltadas com a situação e temem passar por algo parecido.

A estudante de educação física, Daiane Gazola, 39, disse ter se sentindo indignada quando viu o vídeo. “Você não ser respeitado no trânsito como ciclista já é difícil de aceitar, e ainda uma situação dessas se torna revoltante”, desabafa.

Ela pedala há três anos e admitiu que, apesar de ter grupos de ciclistas que sempre pedala junto, ela ainda faz alguns pedais sozinha quando não tem companhia. “Receio sempre tem, mas quando o percurso é conhecido e movimentado vou mais tranquila. Procuro esses percursos de movimento e sempre tem alguém avisado sobre o caminho que irei fazer e previsão de retorno”, conta.

A veterinária, Graziele Cristina da Silva, 26, começou a pedalar há mais tempo, mas está com um treino mais regular desde fevereiro de 2020. Ela conta que pedalava sozinha no início, mas que quando aumentou o número de ciclistas na cidade e passou a fazer parte de grupo, descobriu alguns relatos de homens que mexem com mulheres, ouviu sobre o perigo de pedalar sozinha, principalmente na área rural e teve medo. “Não aconteceu nada diretamente comigo, mas peguei medo de pedalar sozinha. Ultimamente estou até pedalando menos do que gostaria porque os horários dos pedais de grupo não andam batendo com meus horários livres”, relata.

Sobre o vídeo do assédio que a ciclista sofreu em Palmas, Graziela disse ser deplorável. “É complicado ser mulher e ser ciclista. A gente vive com medo e ainda tem julgamento das pessoas. Tem quem julga se está pedalando com turma mista, tem quem julga porque vai deixar o marido em casa para pedalar, vai ter gente julgando a moça assediada dizendo algo sobre a roupa, tem de tudo, sempre tem”, lamenta.

A analista financeira Karla Letícia Felisberto Beguetto, 35, pedala há mais de cinco anos por incentivo do marido que já era dos pedais. “Tenho medo de pedalar sozinha, por isso que vou com meu marido ou com amigos. Existe o medo de assédio e também de algum acidente”, conta.

Ela disse ter se sentido muito triste quando viu o vídeo. “As mulheres hoje em dia não têm um minuto de paz. As pessoas precisam nos respeitar mais”, afirma. Karla que pedala há bastante tempo viu grupos de ciclistas surgirem, diminuírem, acabarem e agora surgirem novamente com força. Ela acredita que a pandemia seja o principal fator para o aumento do número de ciclistas.

“Houve um aumento significativo na procura de esportes, as pessoas começaram a se preocupar mais com a saúde física e mental. Como a bike é um esporte praticável ao ar livre se tornou uma boa opção para praticar atividade física de forma segura em relação à pandemia. O bom é que com esse aumento de ciclistas me sinto mais segura em todos os aspectos quando pedalo”, afirma.

O assédio registrado no vídeo ocorreu no estado do Paraná, e segundo dados da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), o Paraná registrou 3.914 casos de crimes contra a dignidade sexual, no primeiro semestre de 2021. Os registros incluem casos de assédio, estupro e importunação sexual.

Em reportagem ao G1, a cicloativista Viviane Mendonça, de Curitiba, falou sobre o tema. Ela lidera o coletivo 'Vou de Bike e Salto Alto', com mais de 23 mil participantes de todo o Brasil. De acordo com ela, são diários e frequentes os relatos de ciclistas que são assediadas enquanto pedalam. 

O grupo criado em 2016 reúne, pelas redes sociais, mulheres interessadas em ciclismo, que trocam experiências e dicas sobre o esporte. De acordo com Viviane, existem diversas formas de agressão que ciclistas mulheres sofrem frequentemente. 

"Pode ser um carro passando muito perto de propósito, pode ser um comentário ou algum assédio mais agressivo mesmo. Todas são situações que inibem as mulheres", afirmou.