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Assexualidade ainda é pouco conhecida e discutida

Publicada dia 17/10/2018 às 22:04:57

Thaís Balielo

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Apesar de pouco discutida, cerca de 7,7% das mulheres brasileiras e 2,5% dos homens, entre 18 e 80 anos, são assexuais segundo dados do Programa de Estudos da Sexualidade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (ProSex-IPq). Os assexuais são pessoas que não têm uma sexualidade orientada nem para heterossexual, nem para homossexual, nem para bissexualidade, ou seja, não sentem atração sexual nenhuma e vivem muito bem assim, não sentem necessidade de fazer sexo.

O psicólogo Regis Pilati explicou que a assexualidade não é uma disfunção biológica. “Se a pessoa está bem assim, não tem problema. O assexual não quer sexo e não sente falta. O problema está quando a falta de vontade de sexo surge e não é um padrão da pessoa”, explica.

Pilati explica que na pessoa assexual a sexualidade dela não se concentra no ato sexual.  “A satisfação dela é diferente de outra pessoa. O ser humano tem a sensualidade dele e a sexualidade dele, querendo ou não. Para cada um isso funciona de um jeito. Tem pessoas que tem mais libido do que outras. Existem pessoas que são essencialmente sexuais e outras que gostam mas não é primordial. Uma pessoa assexual é uma pessoa que encontra a saciedade dela de outro jeito”, diz.

Lydia, 23, (nome fictício) contou à reportagem que não teve nenhum momento de sua em que conheceu uma pessoa e pensou em ter relações sexuais como uma possibilidade de interação. “Basicamente é algo que não existe ou tem relevância alguma pra mim. Não é sobre ter desejo sexual ou faltar desejo sexual, é sobre o que as pessoas sentem ou deixam de sentir por outras pessoas”, diz.

Ela explica que a assexualidade é um espectro, dentro do qual existem assexuais fluidos, gray-sexuais, demissexuais e etc. que entram no espectro da assexualidade por vivenciarem ausência parcial de atração sexual. “Eu, pessoalmente, sou assexual estrita, ou seja, não sinto atração sexual de forma nenhuma. Eu não sinto vontade de ter relações sexuais com outra pessoa, nem sinto falta de sentir vontade, ou de ter uma namorada ou namorado. Não tem nenhum desejo que eu precise redirecionar pra outras áreas da minha vida, tipo comida. Não tem nada de mim que está incompleto, não tem nada que eu perdi, só algo que eu nunca tive e nunca senti falta. Eu também não sinto atração romântica – o termo pra isso é ser arromântica. Nunca tive um relacionamento e nunca quis ter”, revela.

O processo de se descobrir assexual começou na adolescência e foi concluído na faculdade por Lydia. “Eu percebi que alguma coisa era diferente comigo durante a adolescência. As meninas falavam de beijar e eu simplesmente não entendia essa vontade. Eu ficava com meninos porque eu sabia que não gostar de beijar não era normal, então eu racionalizava que era porque eu não tinha conhecido a pessoa ‘certa’. Mas na verdade beijar era uma experiência totalmente mundana, não me dava nenhum prazer, e pra ser honesta me fazia me sentir muito mal”, conta.

Lydia conta que tinha esse sentimento desde os treze anos, mas foi só no fim do colegial que foi encontrar o termo assexual na internet. Então fui pesquisar e encontrei o site da AVEN, fiz uns testes online, li alguns depoimentos e entendi que era uma coisa real, com uma comunidade que compartilhava esses sentimentos, mas eu ainda não aceitava que eu era assim. Foi só na faculdade, depois que eu não consegui me forçar a gostar de um cara que tinha tudo pra eu gostar que eu parei de me iludir. Mas eu estou bem feliz onde estou agora”, garante.

Preconceito – O psicólogo Regis explica ainda que o assexual também sofre preconceito e muitas vezes cede a pressão da sociedade para fazer sexo. “O jovem pode procurar satisfazer o padrão que os amigos buscam e sofrer muito com isso. Tudo aquilo que a gente faz que não é da nossa natureza estamos sendo agressivos com a gente. A sexualidade exige muito de nós, é preciso querer para que ocorra a sexualidade de fato. É uma violência se arriscar na prática sexual para agradar o outro”, argumenta.

Lydia pondera que o preconceito que acontece com a comunidade assexual não é necessariamente violento como acontece com LGBTI’s, mas eles são ignorados e apagados. “Muitas pessoas simplesmente não acreditam que a assexualidade exista, pensam que seja algum distúrbio hormonal ou psicológico, ou que inventamos porque somos ‘mal-amados’. Ouvimos esse discurso dentro da própria comunidade LGBTI, muitos rejeitam a existência da assexualidade ou que ela pertença ao grupo LGBTI porque ‘não somos oprimidos’. É comum ouvir que a gente é incapaz de sentimentos e que não sabemos amar, o que é totalmente errado”, afirma.