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Gírias “tops” têm sido incorporadas à língua

Publicada dia 23/08/2019 às 17:06:48

Thaís Balielo

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Por definição, a gíria é um tipo de linguagem característica de um determinado grupo social, usada principalmente entre os jovens para tornar uma conversa mais informal. Em função de sua aceitação, pode acabar se estendendo à sociedade de maneira geral, sendo incorporada ao vocabulário do dia a dia. Nos últimos anos, podemos observar o surgimento de novas gírias, especialmente aquelas ligadas ao mundo digital e às redes sociais.

A professora de língua portuguesa Layss Pinheiro lembra que até pouco tempo atrás, quaisquer mudanças no uso da língua portuguesa eram consideradas um risco para a preservação do idioma. “Todos os fenômenos linguísticos que não seguissem a norma culta eram vistos de maneira preconceituosa: qualquer falante que desejasse usar a língua de maneira correta, civilizada, elegante precisaria seguir um modelo linguístico”, diz.

Layss pondera que, com o surgimento de uma área do conhecimento denominada Sociolinguística (depois da década de 50 do século XX) essa visão foi completamente alterada.  “As variações linguísticas são um fenômeno natural. Hoje se tem consciência de que a língua é influenciada pelos usos sociais que os falantes fazem dela, ou seja, ela não é uniforme nem padronizada”, explica.

Segundo o que a professora explica, hoje existe a noção de que o uso que uma pessoa faz da língua tem a ver com inúmeros fatores, dentre eles o contexto, ou seja, a situação de comunicação. “As gírias surgem em situações informais de comunicação, ou seja, situações mais descontraídas, quando existe uma familiaridade entre os interlocutores”, argumenta.

Layss explica que, originalmente, as gírias surgem para marcar a identidade de um grupo. “São espécies de códigos secretos para um determinado grupo manter interações. Esses códigos eram associados a grupos pertencentes às camadas inferiores da sociedade. Na definição do dicionário Aurélio (1999, p. 989): linguagem de malfeitores, malandros, etc., com a qual procuram não ser entendidos pelas outras pessoas”, cita.

No entanto, com a globalização, as mídias, em especial a televisão e as redes sociais começaram a disseminar muitas gírias, tornando-as não mais veladas, específicas de um determinado grupo social. “Por isso é que muitas gírias já estão nos dicionários. Acontece, então, uma espécie de redimensionamento do conceito de gírias, de seu uso e de sua aceitação. Ao tomar espaço na cultura de massa, a gíria começou a ser aceita, o que favoreceu a atenuação do preconceito”, acredita.

Questionada sobre como o uso de gírias pode atrapalhar a pessoa, Layss afirma que nenhuma variação linguística atrapalha. “Na verdade, o que nós, professores da língua, dizemos é que não existe erro; existe, sim, adequação. Se a pessoa utilizar determinada variação linguística adequada a seu contexto, ela estará cumprindo o papel principal da língua: comunicar. Portanto, usar gírias em contextos informais (num bate-papo, por exemplo) é totalmente normal e até desejável. Já em uma redação para o vestibular, por exemplo, o uso adequado da língua é o da norma culta”, aconselha.

Layss cita alguns exemplos em que o uso da gíria é inadequado ao contexto de comunicação: na comunicação oral, por exemplo, em uma palestra, em uma entrevista de emprego, em um ambiente de trabalho, deve-se atentar ao fato de que é mais adequada uma linguagem formal. “O uso excessivo de gírias nesses contextos não é adequado, mesmo que seja uma exposição mais amigável, a linguagem merece cuidado e deve ser usada de forma precisa”, afirma.